Minha Experiência como Astrônomo Amador - 58 Anos dedicados a ciência do Céu

Nelson Travnik*

A Astronomia é de todas as ciências aquela que recebe a maior contribuição dos aficionados.


I - Um Longo Caminho

Comecei a me interessar pela astronomia desde 1954, através de um amigo e os livros de Camille Flammarion (1842-1925). Meu primeiro instrumento foi uma luneta alemã antiga com apenas 40 mm de abertura. Não tardou para que neste mesmo ano, com mais dois amigos, Ruy Q.F. Alves e Fausto B. Andrade, já falecidos, fundasse com recursos particulares o Observatório Astronômico Flammarion, OAF, na cidade onde residíamos, Matias Barbosa - MG. Em 1956 conseguimos adquirir um telescópio refletor newtoniano de 4” da firma DFV Vasconcelos de São Paulo. A grande oposição marciana de 1956 foi observada com esse instrumento bem como 225 estrelas duplas constantes do ‘Norton Star Atlas’. Em 1959 conseguimos adquirir uma objetiva de 100mm da firma Clavé de Paris bem como 4 oculares, Barlow X2, porta ocular e luneta de pontaria. Com esse instrumento dei inicio as observações sistemáticas do planeta Júpiter e o relacionamento com entidades do exterior. Em 1968, através da indicação do Dr. Ronaldo R. F. Mourão, coordenador no Brasil do Programa LION da NASA-JPL-SMITHSONIAN INSTITUTION, passamos a participar do Projeto Apollo para observação dos chamados TLP’s (Fenômenos Transitórios Lunares). Terminado o Programa, fomos indicados pelo Dr. Ronaldo Mourão a fazer um levantamento das observações brasileiras analisando as três mais importantes. Este trabalho foi publicado e pode ser solicitado em meu e-mail, nelson-travnik@hotmail.com. As observações em Júpiter ganharam muita qualidade e notoriedade quando em 1971 adquirimos a luneta “Jagers’ de 152mm do Observatório Kappa Crucis de Belo Horizonte do amigo Ernesto Reisenhofer. Neste mesmo ano aconteceu a oposição periélica de Marte. Além dos desenhos, obtivemos 70 diapositivos coloridos e flagramos o inicio de uma tempestade de poeira. Todo este material foi enviado ao ‘Mars International Committee’, sediado no Observatório Lowell em Flagstaff, Arizona, e coordenado pelo astrônomo Charles Capen. Dele recebemos os maiores elogios e posteriormente algumas constatações nossas foram publicadas. Resta mencionar ainda nossas observações de cometas que passamos a observar quando da utilização de um telescópio ‘Maksutov’ de 150mm Zeiss com câmara astrográfica 56/225 cedido por empréstimo pela Universidade Federal de Juiz de Fora, UFJF - MG. Com ele fotografamos em primeira mão no País os cometas Bradfield 1974b e West 1975n. Neste último descobrimos uma irregularidade no movimento orbital cujo resultado foi publicado no Boletim da UFJF. Ao longo desses anos, participei de vários congressos no País e dois deles no exterior (Argentina e Uruguai). Estas são resumidamente algumas atividades realizadas no OAF, que era uma instituição voltada exclusivamente para trabalhos científicos. Tudo com recursos particulares, sem auxilio de qualquer órgão. 

II - Triumph des Willens - Trunfo da Vontade

As atividades realizadas no Observatório Flammarion sobejamente conhecidas no meio astronômico foram meu passaporte para que, mais tarde, em 1976 recebesse convite do colega Jean Nicolini (1922-1991) e do então prefeito e amador de astronomia de Campinas, Lauro P. Gonçalves, para integrar a equipe da Estação Astronômica Municipal, mais tarde Observatório Municipal de Campinas ‘Jean Nicolini’. Em 1982 fui indicado para Diretor, cargo que exerci até 1994, ano em que me aposentei da Prefeitura. Em 1985 participei da fundação do Observatório Municipal de Americana - SP, e mais tarde em 1992 do Observatório Astronômico de Piracicaba - SP, instituições onde trabalho atualmente. Em 1991 fundei a microempresa ‘Nelson A. S Travnik Campinas M E que elabora projetos de Observatórios, Planetários, venda e manutenção de equipamentos astronômicos. A partir de 1976 passando a viver profissionalmente em astronomia, credito meu sucesso:

1 – as constantes visitas aos Observatórios Nacional, CNPq, MAST, e do Valongo (UFRJ), Rio de Janeiro - RJ, que permitiu aprender e apurar técnicas observacionais e fotográficas;

2 – Minha filiação as ‘Sociedade Astronômica da França (SAF); “Associação dos Observadores Lunares e Planetários” (ALPO), a “Associação Britânica de Astronomia” (BAA), a “Liga Latino Americana de Astronomia” (LIADA), a “Sociedade Astronômica da Suiça” (SAG), a “União Internacional dos Astrônomos Amadores” (IUAA) e a “Agrupação Astronômica de Sabadell” (AAS).

III - Minhas experiências como astrônomo amador recomenda:

1- Procure realizar trabalho sistemático, compatível com instrumentos e periféricos a serem empregados;
2- Escolha a área que mais o atrai e que permita extrair informações/dados válidos para a comunidade astronômica;
3- Mesmo com aberturas modestas, atualmente as melhores câmaras CCD permitem estudos e descobertas em supernovas e detecção de fenômenos atmosféricos nos planetas gasosos, para ficar somente nesses dois exemplos;

4- Não queira observar tudo. Dedique-se somente a uma ou duas áreas. Vale mais um trabalho bem feito que vários mais ou menos;

5- Observações solares é um campo fértil desde que feitas diariamente.
Não necessita grandes instrumentos. Durante 30 anos Jean Nicolini realizou contagem das manchas solares apenas com uma luneta ‘Vion’ de 50mm. Foram utilizadas em tese de mestrado de um colega;

6- Observação de variáveis é talvez a área de maior contribuição dos amadores e pode ser feita até com binóculos. Filie-se a AAVSO;

7- A selenografia relegada após as missões Apollo está retornando com força total. Muitas constatações da ocorrência de TLP’s estão sendo feitas bem como descobrimentos de certas formações que não constavam nos atlas lunares. Mantenha contato com o Observatório Lunar Vaz Tolentino em Belo Horizonte, MG. http/www.vaztolentino.com.br;

8- Envie suas observações para os centros especializados no exterior e no Brasil para a REA. O intercâmbio de dados e informações é indispensável! Compareça sempre que puder aos EREA, ao ENAST e alguns importantes do exterior;

9- Seja membro/sócio das entidades amadoras que realizam excelentes publicações, efemérides, circulares e que possuam departamentos específicos em várias áreas.

IV - Caso queira trabalhar profissionalmente

Lembre-se que existe hoje um bom número de observatórios e planetários municipais e estaduais que empregam astrônomos amadores de bom nível técnico. A oportunidade estende-se até em colégios que erigiram observatório e planetários móveis para os alunos. 

Algumas publicações do autor:
Livro: “Os Cometas” – Editora Papirus, Campinas, SP
Apostilhas, manuais: Como Observar o Planeta Júpiter; Lua, nosso Satélite Natural; O Básico sobre o Sistema Solar; O que você sabe sobre o Calendário?; Você acredita em Horóscopo ?.

* - Nelson Travnik é astrônomo, diretor do Observatório Astronômico de Piracicaba - SP e Membro Titular da Sociedade Astronômica da França.

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