Ora, direis ouvir estrelas em Campinas?

 Nelson Alberto Soares Travnik

Que a contemplação do céu em uma noite pura e tranqüila encanta e fascina, é sabido desde o alvorecer da humanidade. Os desenhos e gravuras dos astros em algumas cavernas pré-históricas, são um testemunho desses tempos longínquos. Isso proporcionou aos povos mais tarde, conhecimentos imprescindíveis na elaboração dos calendários e conhecer o mecanismo das estações do ano para saber a hora de plantar e colher. Nas latitudes elevadas era uma questão de sobrevivência. Da observação visual aos proporcionados mais tarde pela construção de instrumentos ópticos aliados as modernas tecnologias atuais de ampliação e digitalização de imagens, os conhecimentos sobre o universo deram um salto gigantesco. Nos últimos anos a descoberta de planetas orbitando outras estrelas, levou a conclusão que são infinitos os mundos habitados e que nosso habitat é comparável a um grão de poeira ao sabor dos ventos do deserto.

Mas não somente perscrutar o universo através de meios ópticos em terra e no espaço através dos telescópios e sondas espaciais, a introdução da radioastronomia provocou uma verdadeira revolução nos conhecimentos astronômicos. Tudo começou em 1931 com a primeira observação de ondas de radio provenientes do céu pelo engenheiro norte-americano, Karl Guthe Jansky (1905-1950) que trabalhava na investigação de problemas de comunicação entre as cidades de Nova York e Londres. Analisando um ruído análogo a uma fraca estática de radio vindo da constelação do Sagitário, identificou mais tarde a fonte como sendo Sagitarius A. Isso permitiu estudar os fenômenos das ondas eletromagnéticas freqüência radio permitindo detectar a chamada radiação cósmica de fundo primordial que é observada em todo o céu e que teria dado origem ao Big Bang, a grande explosão. Essa descoberta foi realizada por dois pesquisadores norte-americanos, Arno Penzias e Robert Wilson dos Laboratórios Bell. A descoberta valeu para a dupla o Prêmio Nobel de Física de 1978. Em 1609, Galileu Galilei (1564-1642), ao lançar seus olhos para o céu através de uma rudimentar luneta por ele construída, jamais poderia imaginar que descobriríamos mais tarde tantas coisas sobre o universo ao observar um ruído que não pode ser visto com nossos olhos.

Os radiotelescópios podem ser móveis, imóveis ou em cadeia. O maior móvel é de Effelsberg na Alemanha com uma antena de 100 metros de diâmetro. O maior imóvel é o que fica na região montanhosa de Guizhan na China com antena de 500 metros de diâmetro. Em cadeia atualmente, ‘o maior ouvido do universo’ é o ALMA, “Atacama Large Milimeter Array”, localizado a 5000 metros de altitude na Zona de Chajmantor, Atacama, Chile. Com 66 antenas de 12 metros de diâmetro, ele pode registrar imagens inéditas de nascimentos de estrelas, galáxias e estudar e descobrir moléculas que se formam no espaço entre as estrelas em ondas milimétricas e sub-milimétricas que pouquíssimos telescópios conseguem. É um maiores “ouvidos” do nosso planeta, apto a um dia receber a tão aguardada mensagem: também estamos aqui! E se existem pessoas incrédulas, vale lembrar aqui as palavras de Carl Sagan (1934-1996): “Ausência de evidência, não é evidência de ausência”.

No Brasil, os primeiros passos da radioastronomia foram dados pelo francês Pierre Kaufmann (1938-2018), pioneiro no ensino e pesquisa. É dele o primeiro radiotelescópio construído em 1959 ao lado do Planetário do Ibirapuera em São Paulo. Em 1970 foi o responsável pelo projeto e construção do Radiotelescópio de Itapetininga em Atibaia, SP. Com uma antena de 14 metros de diâmetro operando em ondas milimétricas, ele é ainda o maior do Brasil e é operado pelo INPE, Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. A radioastronomia é também um campo fértil nas áreas do ensino e divulgação. Nesse sentido, Campinas pode se orgulhar de possuir um radiotelescópio pedagógico único no País com antena de 12 metros de diâmetro. Ele é parte do Museu Aberto de Astronomia, MAAS, situado no Pico das Cabras a 1100 metros de altitude em frente ao Observatório Municipal de Campinas Jean Nicolini. Ele está sintonizado na janela da emissão do hidrogênio em 1420 MHz que é comum no universo e que é usada para emitir como rastrear possíveis mensagens provenientes de uma civilização extraterrestre.  Os ‘sons do universo’ vai para um computador e é projetado em uma tela onde os visitantes ouvem as explicações sobre o que está sendo mostrado. Antes é dada uma aula sobre o que é a radioastronomia e sua história.

O MAAS está aberto à visitação todos os sábados, domingos e feriados. São também atendidas visitas escolares em todos os níveis e grupos interessados. Regularmente são oferecidos cursos de astronomia. Informações em: informacoes@picodascabras.com.br

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