“O Flammarion Brasileiro”
Quinta-feira, 16 de janeiro, 2014, 11h00. Depois de três anos, uma nova oportunidade de reencontrá-lo em sua residência no ‘campus’ do Observatório Nacional, CNPq, MCT. Foi uma excelente ocasião de conversarmos sobre os temas mais atuais da astronomia, os trabalhos e os progressos das instituições brasileiras e os novos planetários e observatórios que estão sendo construídos tanto oficiais como particulares. Nos detivemos sobre as observações dos aficionados que mercê novas tecnologias à disposição, realizam trabalhos e descobertas de altíssimo nível. Conversamos muito lembrando os velhos tempos no Observatório Nacional, ele ainda muito jovem como eu, cercados por outros astrônomos, a maioria já falecidos e de grata lembrança. Tempus Fugit, e como! Na ocasião me mostrou dois livros seus publicados no Japão e adiantou que outro já esta no prelo nos Estados Unidos.
Ao longo das 85 obras publicadas, mais de 600 artigos em revistas, periódicos e jornais, o destaque fica para o seu “Dicionário Enciclopédico de Astronomia e Astronáutica”, obra exaustiva, fruto de muitos anos de pesquisa. Já em 2ª edição pela Editora Nova Fronteira, segundo ele, está a caminho uma 3ª edição. É impossível um astrônomo ou interessado não possuir esta obra em sua estante. É no gênero, a mais completa das Américas e recebeu elogios de algumas das maiores celebridades da astronomia, ciência espacial e historiadores.
A maioria das pessoas geralmente costuma aliar Mourão somente a literatura astronômica e não conhecem suas contribuições científicas. São inúmeras. Elas estão relatadas na minha série “Personagens da nossa Astronomia”. Enviarei com prazer a quem me solicitar. Entre elas estão a descoberta de 72 novos asteroides feitas em seu estágio no Observatório La Silla, Chile. Seu colega H. Debehogne homenageou Mourão com seu nome no asteroide 2590 descoberto por ele em 22 de maio de 1980. Outra pesquisa que reputo importante foi em 1969 quando constatou a existência de um companheiro invisível na estrela dupla Aitken 14, confirmada pelo astrônomo Baize do Observatório de Paris. Na ocasião Mourão levantou a hipótese de que poderia ser um novo sistema solar e, sendo assim, isso adentra na área dos exoplanetas, razão pela qual deveria ser motivo de investigação. Essa descoberta é quiçá pioneira neste campo de pesquisa e isto, acredito, merece ser considerada.
Minha identidade com Mourão é muito grande, tanto pela atenção e conhecimentos a mim transmitidos como talvez termos a mesma idade e sermos do mesmo Estado do Rio de Janeiro. O fato de ser ele um astrônomo profissional e eu amador, em momento algum foi motivo de algum distanciamento o que na época as vezes acontecia. Ele demonstrou sua atenção e valorização com os astrônomos amadores ao criar com um grupo, o “Clube de Astronomia do Rio de Janeiro”, CARJ, fundado em 30 de junho de 1976. É o Presidente de Honra do CARJ. Por morar próximo ao Rio, por quase 22 anos frequentei o Observatório Nacional como também o Observatório do Valongo, UFRJ. Essas duas Instituições foram a minha escola.
Na despedida Mourão me ofereceu o livro de sua autoria “Astronomia & Budismo – Uma Jornada rumo ao Distante Universo” que gira sobre uma conversa dele com o famoso espiritualista Daisaku Ikeda. É sempre oportuno, salutar e mesmo natural uma incursão nesta área como aliás o fizeram físicos e astrônomos famosos .Em todo o tempo que estivemos conversando, esteve seu filho Marcelo. É ele que cerca o pai com denotada atenção, cuidados e carinho. Nota dez!
O “Flammarion Brasileiro”, como eu o chamo, é e ainda será por muitas gerações, o astrônomo que mais despertou mentalidades voltadas a astronomia no Brasil. Mourão é uma referência e um orgulho para nosso País.
Nelson Travnik, diretor do Observatório Astronômico de Piracicaba, SP, e Membro Titular da Sociedade Astronômica da França.