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quinta-feira, 1 de março de 2012

Há 150 anos surgia, A Pluraridade dos Mundos Habitados

*Nelson Travnik

Há 150 anos surgia na França um livro abarcando um tema bastante polêmico: a vida em outros planetas. Mesmo para a comunidade científica, escrever sobre o assunto àquela época era um ato de coragem.

UMA IDÉIA ANTIGA

A possibilidade de existir outros mundos com formas de vida é antiga. Na Grécia já se pensava nisso. Epicuro (341 -270) dizia que assim como os átomos são infinitos em número, não há nenhum obstáculo para haver também um número infinito de mundos parecidos ou não com o nosso. Ao retomar a ideia, o filósofo italiano Giordano Bruno (1550-1600) em seu livro ‘Del Infinito Universo e Mondi’, além de defender o sistema heliocêntrico de Nicolau Copérnico (1473-1543), escrevia: “há incontáveis terras orbitando em volta de seus sóis da mesma maneira que os seis planetas do nosso sistema”. Como sabemos, essas ideias não agradaram a Igreja e a Inquisição por falta de retratação, acabou condenando-o à fogueira que aconteceu em Roma, no Campo de Fiori, em 9 de fevereiro de 1600.

HÁ 150 ANOS

O tema voltaria a ser alvo de acirradas discussões. Em 1862, com apenas 20 anos, o astrônomo Camille Flammarion (1842-1925), conseguiu através da editora Mallet-Bechelier de Paris, a publicação do seu livro “A Pluralidade dos Mundos Habitados”.

Não é difícil imaginar o impacto que o livro provocou na maioria das pessoas embevecidas com a idéia da Terra ser um planeta especial, centro da criação e único a abrigar vida. Críticas à parte, o livro, contudo, foi bem recebido entre celebridades como Victor Hugo (1802-1885) e o imperador Napoleão III.

Em 1864 a primeira edição esgotou. Uma após uma as edições não paravam. Meu exemplar de 1921 já era a 30ª edição!

A REAÇÃO

Não se fez esperar. “Vós não sóis um astrônomo, sóis um poeta!”. Com essas palavras, Urbain Joseph Le Verrier (1811-1877), o imortal descobridor do planeta Netuno, então diretor do Observatório de Paris, demitiu o jovem Flammarion pelo grave erro de haver escrito o livro sobre um tema inaceitável para ele.

Le Verrier achava que tal era uma idéia medíocre e pura fantasia. Flammarion havia sido aceito em junho de 1858 como aluno astrônomo lotado no Deptº de Longitudes, encarregado dos cálculos das posições da Lua para o conhecimento do tempo. Contudo o sucesso do livro em todo o mundo fez com que mais tarde, reconhecendo o erro, Leverrier convidasse Flammarion a reingressar no Observatório para se ocupar de observações micrométricas de estrelas duplas e múltiplas o que ele fez impecavelmente. Seu ‘Catálogo de Estrelas Duplas e Múltiplas’ publicado em 1878 foi durante muitos anos o melhor do mundo!

EXOPLANETAS

A primeira confirmação de exoplaneta surgiu apenas em 1990 com os radioastrônomos Aleksander Wolszczan e Dale Frail. Na época foi difícil a comunidade astronômica aceitar os resultados, pois eram dois planetas orbitando o pulsar PSR 1257+12 já que, como sabemos, esses objetos são resultados de estrelas que morrem explosivamente como supernova. A partir daí foi uma sucessão de descobertas. Elas aumentam a medida da potencia dos instrumentos e refinamento de novas tecnologias na Terra e no espaço. Um exemplo disso é o moderno satélite Kepler que em menos de dois meses quando foi lançado em 2010, descobriu 750 candidatos a exoplanetas! De candidatos a detectados, até 2011, 708 planetas foram registrados em 534 sistemas solares, segundo cálculos compilados pela Enciclopédica de Planetas Extra-Solares. Ao lado do Programa SETI (Search for Extraterrestrial Inteligence), o assunto tem sido levado tão a sério, que a União Astronômica Internacional, IAU, fundada em 1919, criou há mais de vinte anos uma comissão destinada a averiguar assuntos que envolvam a pluralidade dos mundos.

Se estivesse vivo, o que diria Leverrier nessa onda de descobertas de planetas orbitando outras estrelas? O que outrora parecia um privilégio do Sol, hoje já é aceito que a maioria das estrelas possuem planetas ao seu redor e por analogia, também existirão satélites, asteróides e cometas. Os cientistas acreditam que pode haver civilizações lá fora que já chegaram a um estágio de desenvolvimento suficiente para emitir ondas de rádio. Tal possibilidade já foi aventada no filme “Contato”, de 1997, baseado no livro de Carl Sagan (1934-1966). Através de gigantescos radiotelescópios como os de Arecibo, Porto Rico, o Ratan-600 da Rússia, o de Effelsberg, Alemanha, o Robert C. Byrd Green Bank nos EEUU e muito em breve o ALMA no Chile, estamos aptos a receber qualquer emissão de rádio vinda do espaço e assim poder dizer: também estamos aqui! A astronomia está celebrando este ano, o 150º aniversário do lançamento do livro de Flammarion. Um nome, uma mente que avançou no tempo enfrentando altivamente dogmas, incredulidades e preconceitos. Estamos no limiar de constatações que irá mudar a estrutura filosófica milenar criada pelo homem. Quem viver verá!

* O autor é astrônomo dos observatórios municipais de Americana e Piracicaba, SP e Membro Titular da Sociedade Astronômica da França, SAF.

REFERÊNCIAS - CONSULTAS

- La Pluralité des Mondes Habités, C. Flammarion, Ernest Flammarion Editeur
- L’ Astronomie, revista mensal da Sociedade Astronômica da França, SAF
- Mémoires Biographiques et Philosophiques d’ um Astronome, C. Flammarion, Ernest Flammarion Editeur
- Scientific American, revista mensal, Duetto Editorial

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